Minha avó foi a pessoa mais incrível que conheci. Além e acima de seu tempo. Sua vida foi orientada por regras que ditava para si mesma. Regras morais, às quais seguia fielmente. Também regras de independência e liberdade, que não excluiram meu avô de sua vida.
Pelas manhãs, ao acordar, abria a porta dos fundos e, olhando o nascente, recitava uma oração - a única que já a vi rezar:
"Librame, Dios
De mis malos pensamientos
De mi para con losotros
Y de losotros para conmigo.
Librame, Dios
De mis malas palabras
De mi para con losotros
Y de losotros para conmigo.
Y librame, Dios
De mis malas acciones
De mi para con losotros
Y de losotros para conmigo.
En nombre del padre,
Del hijo
Y del espirito santo
Amén."
Persignava-se, primeiramente na testa, após, na boca, e depois, no coração. Finalmente, fazia o sinal da cruz tradicional.
Absolutamente, não foi a oração que a tornou a pessoa independende, batalhadora, grandiosa. Mas sua determinação.
Talvez a oração diária, pronunciada com graça e fé, desse-lhe apenas o norte, uma vez que tinha uma personalidade única e vontade inquebrantável.
Jamais a vimos mentir ou maldizer. Casados, ela e meu avô vieram da colônia, no interior, para São Paulo.
De início, aprendeu e aprendeu a ensinar a arte culinária. A menina que casara sem saber fritar sequer um ovo percebeu cedo que não seria esta a sua praia.
Aprendeu e aprendeu a ensinar corte e costura. Montou escola e lecionou toda a vida.
Aprendeu a ler, falar e escrever em várias línguas.
Ajudou muita gente, o que a tornou pessoa de destaque no bairro.
Entretanto, a lição mais importante foi a de que a liberdade é uma conquista diária, impossível sem a independência financeira; de que é preciso ser humilde, para que sejamos respeitados, e de que nada disso pode nos servir se não tivermos dignidade.
Uma postura digna diante da vida, para que sejamos respeitados também por nós mesmos.
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