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terça-feira, 19 de fevereiro de 2013

LITERATURA E GASTRONOMIA - DA FEIJOADA DE VINICIUS A PEDRO NAVA

imagem: www.mercadinhossaoluiz.com.br

Livros podem significar mais do que uma viagem transcendental, em que vivenciamos experiências e sensações novas e, mesmo, inusitadas. O mundo da gastronomia, ainda que a obra não o aborde como pano de fundo, é por vezes referenciado, seja no como servir ou relativamente a pratos, sabores e combinações, conhecidos ou não, dando espaço à história - porque a comida que chega a nós percorreu um longo caminho no paladar da sociedade em que hoje é cultuada.
Existem exemplos magistrais. Separei, para a cultura gastronômica dos aficionados - e quem sabe, o preparar de tais delícias -, alguns exemplos, expostos como prova do sabor do prato velho e sempre novo. 
Os dois primeiros ligam-se à feijoada. Das linhas aqui transcritas percebe-se que a feijoada alcançou um grau tão alto na arte, também culinária, que fez-se verso, com sabor, cheiro e cor, envolvidos em paixão. 
É imperdoável falar-se em feijoada sem a remissão a Nava, suas referências, tanto históricas como gustativas. 
A arte culinária tem segredos do aguçar ou enfraquecer o paladar. Estes pecados, enfatizados pelo escritor,...
hoje são esquecidos nos buffets que enriquecem os olhos para que pequemos ao não apreciar a volúpia dos pratos bem preparados.
Reverenciando Vinícius de Moraes ("Para viver um grande amor", Livraria José Olympio Editora - Rio de Janeiro, 1984, pág. 97.), como não recordar a antológica Feijoada à Minha Moda? É de dar água na boca!

"Feijoada à Minha Moda

Amiga Helena Sangirardi
Conforme um dia prometi
Onde, confesso que esqueci
E embora — perdoe — tão tarde


(Melhor do que nunca!) este poeta
Segundo manda a boa ética
Envia-lhe a receita (poética)
De sua feijoada completa.


Em atenção ao adiantado
Da hora em que abrimos o olho
O feijão deve, já catado
Nos esperar, feliz, de molho


E a cozinheira, por respeito
À nossa mestria na arte
Já deve ter tacado peito
E preparado e posto à parte


Os elementos componentes
De um saboroso refogado
Tais: cebolas, tomates, dentes
De alho — e o que mais for azado


Tudo picado desde cedo
De feição a sempre evitar
Qualquer contato mais... vulgar
Às nossas nobres mãos de aedo.


Enquanto nós, a dar uns toques
No que não nos seja a contento
Vigiaremos o cozimento
Tomando o nosso uísque on the rocks


Uma vez cozido o feijão
(Umas quatro horas, fogo médio)
Nós, bocejando o nosso tédio
Nos chegaremos ao fogão


E em elegante curvatura:
Um pé adiante e o braço às costas
Provaremos a rica negrura
Por onde devem boiar postas


De carne-seca suculenta
Gordos paios, nédio toucinho
(Nunca orelhas de bacorinho
Que a tornam em excesso opulenta!)


E — atenção! — segredo modesto
Mas meu, no tocante à feijoada:
Uma língua fresca pelada
Posta a cozer com todo o resto.


Feito o quê, retire-se o caroço
Bastante, que bem amassado
Junta-se ao belo refogado
De modo a ter-se um molho grosso


Que vai de volta ao caldeirão
No qual o poeta, em bom agouro
Deve esparzir folhas de louro
Com um gesto clássico e pagão.

Inútil dizer que, entrementes
Em chama à parte desta liça
Devem fritar, todas contentes
Lindas rodelas de lingüiça


Enquanto ao lado, em fogo brando
Dismilingüindo-se de gozo
Deve também se estar fritando
O torresminho delicioso

Em cuja gordura, de resto
(Melhor gordura nunca houve!)
Deve depois frigir a couve
Picada, em fogo alegre e presto.


Uma farofa? — tem seus dias...
Porém que seja na manteiga!
A laranja gelada, em fatias
(Seleta ou da Bahia) — e chega


Só na última cozedura
Para levar à mesa, deixa-se
Cair um pouco da gordura
Da lingüiça na iguaria — e mexa-se.


Que prazer mais um corpo pede
Após comido um tal feijão?
— Evidentemente uma rede
E um gato para passar a mão...


Dever cumprido. Nunca é vã
A palavra de um poeta...— jamais!
Abraça-a, em Brillat-Savarin
O seu Vinicius de Moraes"
Seguindo o ensinamento dos grandes mestres, cito a feijoada eternizada nas páginas de Nava (o Pedro), em O Círio Perfeito, 6º livro da série de memórias, Livraria José Olympio Editora. Perfeito no escrever, estiloso, denso e generoso, eternizou o prato nacional, na invenção de G. Lobo:


"Com licença, um parêntese. No meu Baú de Ossos referi, repetindo Noronha Santos, que a feijoada completa é prato legitimamente carioca. Foi inventado na velha Rua General Câmara, no restaurante famoso de G. Lobo, cujo nome se dizia contraído  em Globo. Grifei, agora, o inventado, para marcar bem marcado seu significado de achado. Realmente não se pode dizer que ele tenha sido criação espontânea. É antes a evolução venerável de pratos latinos como o cassoulet francês que é um ragout de feijão-branco com carne de ganso, de pato ou de carneiro - que pede a panela de grés - cassolle - para ser preparado. Passando os Pireneus, é ainda com o feijão-branco, com um toucinho imaculado e com ebúrnea pele de porco que os castelhanos urdem suas judias-à-la-bretona. O nome mesmo mostra que o acepipe veio de fora e das Gálias. Seguindo o caminho das invasões ele atravessa Tui, Ciudad Rodrigo, Badajos, Huelva - ganha Tavira, Elvas, Guarda e Valença do Minho para espalhar-se em Portugal na forma do guando cozido com porco e paio. Mestre Lobo da Rua General Câmara tomou dessa muda européia, plantou e ela pegou aqui, no tronco da feijoada-completa-hino-nacional. Suas variantes brasileiras radicam principalmente em usar o feijão mais comum na região e em juntar ao porco ritual outras carnes, miúdos ou os legumes encontradiços nos locais. A falação é a mesma, só difere o sotaque. Conheço essas recriações de gênio. A maranhense e piauiense que saboreei na casa de tio Ennes e de tia Eugênia e que reencontro na fabulosa casa de Nazaré e Odylo Costa, filho. A cearense, de minhas tias paternas e de minha prima Rachel de Queiroz. A pernambucana, de Dona Maria Augusta e do Seu José Peregrino Wanderley Cavalcanti - pais de meu irmão Joaquim Nunes Coutinho Cavalcanti - o sempre bem lembrado. A baiana, da tia de minha mulher, Dona Elvira Couto Maia Penido, com a suntuosidade de sua rabada; dos anteparos de sua costela de vaca; do seu arco-íris  de louro, açafrão, gengibre, cravo, coentro, cebola, salsalho; e com seu fogo de artifício pimenta-malagueta curtida no dendê. A mineira, de minha Mãe; a paulista, de Dona Luísa Novo Rodrigues. As ecléticas, fazendo aliança Pernambuco-Minas-Rio, como a de Maria do Carmo e  José Nabuco, ou só Minas-Rio como a de minha casa, na Glória, por obra e graça de artistas exímias, como Adélia Maria da Conceição e Rosalina Ribeiro; ou como novamente as da casa de minha Mãe, já no Rio, quando ela abjurou o feijão-mulatinho para converter-se ao preto, ao bom, ao feijão de Uberaba. Luvo a todas, louvo essa irmandade toda, saravá! mas peço perdão de dizer que a melhor - mas a melhor mesmo! ainda é a ortodoxa, católica-apostólica-romana, a carioca de Gêlobo-Globo - sacramento que comunguei na cozinha egrégia de meu tio Heitor Modesto de Almeida! na cozinha insigne de Seu Maneco e Dona Isaura - respectivamente seu pai e sua madrasta.
Ninguém para preparar o grande prato como meu citado tio Heitor. Ele próprio ia escolher o feijão mais igual, mais preto, mais no ponto, grãos do mesmo tamanho e do mesmo ônix. Ele mesmo é que comprava o lombo, a carne de peito, a linguiça, e os ingredientes de fumeiro com que ia compor e orquestrar. A couve mais verde, a farinha  mais fresca e o torresmo mais escorregadio. Seu grande truque era cozinhar sem esmagar um só grão e depois de pronto, dividir em dois lotes. Tomava de dois terços e tirava seu caldo, peneirando. Um terço, esse sim! era amassado, passado, livrado das cascas, apurado e esse caldo grosso é que ia ser novamente misturado aos grãos inteiros. Era assim que em sua casa não se via a desonra da feijoada aguada. Toda a carne fresca, a seca e a de fumeiro, eram cozidas no caldo mais ralo  tirado da primeira porção. Só o lombo era sem contato, desobrigado de outro gosto senão o de sua natureza, o da vinha d'alho em que dormira e o das rodelas de limão que o guarneciam. Quando havia enfiada de feriados, o Modesto preferia preparar de véspera porque, sustentava, a feijoada dormida e entranhada era mais saborosa. Foi ao estro de sua mesa que pus em dia a melhor maneira de degustar a imensa iguaria. Prato fundo, já se vê, de sopa. Nele se esmagam quatro a cinco (mais, menos) pimentas-malaguetas entre verdes e maduras, frescas ou danadas no vinagre. Tiram-se-lhes carocinhos e cascas, deixa-se só a linfa viva que é diluída no caldo dum limão. Esse corrosivo é espalhado em toda extensão do prato. Então, farinha em quantidade, para deixar embeber. Retira-se seu excesso que volta para a farinheira. Sobre a crosta que ficou, vai a primeira camada de feijão e mais uma de pouca farinha. Edifica-se com superposições de couve, de farinha, de feijão, de farinha, das carnes e gorduras, e do respaldo mais espesso cobertura final de farinha. Espera-se um pouco para os líquidos serem chupados, aspirados, mata-borrados e come-se sem misturar. Sobre o fundo musical e uniforme do feijão, sentem-se os graves do fumeiro, o maestoso do lombo, as harmonias do toucinho e os agudos, os álacres, os relâmpagos, os inesperados do subsolo de pimenta. E só. Um prato só. É de boa regra não repetir a feijoada completa. Um prato. Um só porque o bis, como o deboche - é reprovável. 
A polivalência, a adaptabilidade do feijão permitem sua combinação com tudo quanto é legume, com todas as carnes, todos os peixes, mariscos, crustáceos e até as massas como provou Joaquim Nunes Coutinho Cavalcanti, com suas famosas macarronadas -ao-feijão, que deitaram raiz nas cozinhas ítalo-brasileiras do Oeste Paulista. Essa versatilidade dos feijões é que permite a combinação das feijoadas regionais brasileiras a qualquer farinha. A grossa, farinha de pau do Maranhão. A fresca ou a torrada. Simples ou com farofa de ovo ou de torresmo, ou dos dois. A farinha de milho seca, na sua pasta de angu, ou na pulverulência úmida do cuscuz de sal. Meu tio Modesto  aconselhava a de mandioca, simples, sem torrar ou então a de sal-grosso, folha de cebola miúda, embolada na hora com água fervendo. E fora disto, só couve. Isso de feijoada completa com arroz ou com laranja é heresia: o primeiro abranda e a segunda corta o gosto. E este deve ser conservado dentro da exuberância e do exagero da sua natureza barroca. Barroco - eis o termo. Porque como obra de arte (e levando em conta que "...Baudelaire avait bien dit que les odeurs, les couleurs et les sons se répondent...") a Feijoada Completa Nacional está para o gosto como os redondos de São Francisco de São João-Del-Rey, a imobilidade tumultuária dos Profetas de Congonhas do Campo e a Ceia de Ataíde, no Caraça, estão para os olhos. Ainda barroco e mais, orquestral e sinfônico, o rei dos pratos brasileiros está para a boca e a língua como, para o ouvido - as ondulações, os flamboaiantes, os deslumbramentos, os adejamentos, a ouriversaria de chuva e o plataresco dos mestres mineiros de música sacra e do Trio em dó maior para dois oboés e corninglês - Opus 98 de Ludwig van Beethoven. Filosófica, a feijoada completa pelo luto de sua cor e pelos restos mortais que são seus ingredientes é também memento. Depois dela, como depois da orgia, a carne é triste. Não a do prato, a nossa , a pecadora. Patriótica, ela serve tanto à Unidade Nacional como essa língua assim "dulcíssona e canora" que Portugal nos ofertou. É por essas razões que me excedi falando da feijoada. Todas as vezes que dela como - volto à que nos era servida uma vez por semana no Internato do Colégio Pedro II, volto a minha adolescência e ao mundo mágico que a cercou. Devo esse traço de cultura (que ficou sendo escravo e minha memória involuntária), à virtuosidade culinária do nosso Urso-Branco. Tenho pena de não saber se nome de gente para colocá-lo na minha gratidão, ao lado dos de João Ribeiro, Silva Ramos, Floriano de Brito, Badaró e Lafayete Rodrigues Pereira, de quem me veio outra nutrição - a do espírito."


Conheça mais. Faça uma visita aos blogs disponíveis no meu perfil: artigos e anotações sobre questões de Direito, português, poemas e crônicas ("causos"): http://www.blogger.com/profile/14087164358419572567. Esteja à vontade para perguntar, comentar, questionar ou criticar. Acompanhe.Terei muito prazer em recebê-lo.

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Maria da Glória Perez Delgado Sanches
Membro Correspondente da ACLAC – Academia Cabista de Letras, Artes e Ciências de Arraial do Cabo, RJ.

Um comentário:

Anônimo disse...

María da Gloria, ¡me encantó! Siempre escriba porque tienes tanto talento!
Juan Solano de La Sierra

DÊ UMA CHANCE PARA SEUS SONHOS. DA CIDADE GRANDE PARA A CASA NA PRAIA, COM UM GRAAAAAANDE TERRENO.

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MARQUINHOS, NOSSAS ROSAS ESTÃO AQUI: FICARAM LINDAS!

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